A psicanálise cuida do obscuro, do sem sentido, do que foge ao controle, do que parece não ter lugar, não tem nome, não consegue ser representado, do que incomoda e se destina a quem busca caminhos de compreensão ao que sente, à angústia. Destina-se a quem busca ser ouvido.
Podemos chamar esses sintomas ou “sinto mal” de diversos nomes: transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade, crises e separações de relacionamentos, insônia, angústia, pesadelos, depressão, estresse, lutos por perdas de entes queridos.
Até podemos identificá-los por metáforas:
“Sinto como uma pata de elefante no peito que me sufoca.”
“Sinto que não faço nada certo, que nunca nada do que realizo é suficiente.”
“Sinto muito medo, insegurança, e esse medo paralisa minha vida.”
“É como se me sentisse abandonado e isso me faz sofrer.”
“Sinto que não consigo confiar em ninguém e me sinto rejeitado.”
Fato é que o “sinto-mal” ou mal-estar tem a ver com o humano em toda sua complexidade, independentemente da faixa etária, classe social ou qualquer outra subcategoria.
Sejam por metáforas, acontecimentos ao longo da vida que geraram sofrimento ou mesmo nomes científicos que categorizam esses sentimentos angustiantes nos jargões populares ou catálogos médicos, a psicanálise se destina ao tratamento da angústia, manifestada em suas múltiplas formas.
Vamos debater um pouco mais sobre isso? Então vamos avançar em algumas questões...
Um breve recorte histórico
Nós já falamos neste artigo sobre os sinais do inconsciente que nos auxiliam a compreender os sintomas que se apresentam em sua maioria na vida de vigília, como os chistes e os atos falhos, ou durante o sono, como os sonhos, mas nem sempre, ao longo da construção da teoria, existia essa clareza de como os sintomas se consolidavam.
Vou apresentar brevemente uma história interessante da construção da teoria para responder em seguida à pergunta que nomeia o texto (A quem se destina a psicanálise?).
Em 1885, Freud ganhou uma bolsa de estudos e passou a acompanhar um renomado neurologista francês chamado Jean- Matin Charcot (1825-1893). Este atendia pacientes que apresentavam à época sintomas de um transtorno mental conhecido como histeria, cujas causas se encontravam ainda em investigação. Eram em sua maioria mulheres que apresentavam sintomas físicos muito variados, abrangendo desde gagueira e tiques nervosos até paralisias motoras e perdas de consciência.
O que havia disponível enquanto método de tratamento era a hipnose. Por meio dela, essas mulheres entravam em transe e, durante esse período de estado mental alterado, tinham seus sintomas físicos atenuados ou desaparecidos. O problema, no entanto, era que o método era falho e insuficiente, pois, primeiramente, não funcionava em todos os pacientes. Além disso, em outros casos, quando recobravam a consciência após o transe, os pacientes podiam voltar a apresentar os mesmos sintomas ou ainda os substituíam por outros.
Essas pacientes foram por diversas vezes consideradas mentirosas, eram mal compreendidas e incomodavam, pois desvelavam a impotência médica e científica da época. Seus sintomas eram submetidos à prova por audiências que contavam com a presença dos mais consagrados médicos na área, que se reuniam para buscar respostas e resultados mais eficientes.
Como o próprio Freud jamais poderia imaginar, essa grande questão veio a conduzir seus estudos dali em diante e o fez delinear aos poucos uma teoria que explicasse a origem dessa enfermidade, a histeria. Em linhas gerais, o que descobriu era que haviam fenômenos inconscientes que provocavam o aparecimento de tais sintomas físicos.
O trabalho foi em seguida pesquisar qual era a melhor maneira de abordagem no tratamento para acessar a causa dos sintomas, o inconsciente, desenvolvendo mais tarde, por tentativa e erro, o método que ficou conhecido como “talking cure” ou “a cura pela fala”.
Freud desenvolveu uma teoria do funcionamento psíquico, assim como uma metodologia para tratamento das neuroses, indo além sintomas histéricos e abrangendo outros quadros de enfermidades mentais.
Para concluir, a quem se destina a psicanálise e com quais demandas ela trabalha?
Toda a construção da teoria freudiana foi a partir da escuta dessas pessoas em profundo sofrimento, em que Sigmund Freud percebeu que por meio da fala ocorria um processo catártico que auxiliava no alívio da angústia desses pacientes e, por consequência, na dissolução de seus sintomas.
Nesse sentido, se a psicanálise era inicialmente voltada aos casos de histeria, passou a ser usada posteriormente no tratamento de fobias, transtornos obsessivos, paranoias e demais transtornos psicóticos.
Contando com sua difusão e aumento de pesquisas na área, avançou para o tratamento de todas as faixas etárias elaborando metodologias mais eficazes no atendimento à crianças, por exemplo, estruturando a psicoterapia por meio do falar da criança, ou seja, do brincar.
Atualmente configura um campo que contribui no tratamento de vários transtornos mentais: transtornos de ansiedade, alimentares, sexuais, do sono, dissociativos, bipolaridade, autismo, depressivos, psicóticos, obsessivo-compulsivo, de personalidade e outros.
A psicanálise cuida da angústia da qual ninguém escapa. Ela busca a compreensão da verdade que habita na singularidade de cada sujeito. Escuta o que é íntimo, único, repetitivo, singular e louco, também considerando que o único de cada sujeito não é apartado do contexto social. Busca a liberdade.
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Te espero numa próxima! Até!
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